O Festival de la luz (Buenos Aires/AR) nasceu no ano de 1989 como
um evento único, chamado “Encuentros Abiertos”. Entretanto, pelo sucesso que obteve,
passou a ser um evento anual, e desde o início da década de 90 cumpre o seu
papel de evento internacional, sendo o primeiro festival de fotografia da
América-Latina.
Hoje, os Encuentros
Abiertos – Festival de la luz estão na sua XVII edição, e congregam uma
rede de exposições, conferências e tantas outras atividades em que a produção
fotográfica e a reflexão sobre esta prática trazem fotógrafos do mundo inteiro
para a capital argentina.
No intuito de promover uma troca entre profissionais
reconhecidos na área e fotógrafos iniciantes, há a sessão de Leitura de
Portfólios, um momento em que fotógrafos apresentam seu trabalho e recebem uma
“devolución”, uma crítica sobre os diversos aspectos da produção que é
apresentada.
Nesta sessão, o principal trabalho apresentado foi o
intitulado Mais além do fim do mar, um ensaio poético-documental sobre os
rituais mágico-religiosos de celebração a Iemanjá, que acontecem no dia 2 de
fevereiro na Praia do Cassino (Rio Grande/RS), extremo-sul do Brasil.
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Ensaio Mais além do fim do mar, de Beatriz Rodrigues |
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Ensaio Mais além do fim do mar, de Beatriz Rodrigues |
Com a experiência de escuta dos diversos profissionais, fica
mais claro que em fotografia não se trata de “ter os melhores equipamentos” ou
fazer fotos “bonitas”. Também um portfólio não é a reunião das suas melhores
fotos, mas a definição de um trabalho que tenha uma unidade, e que seja
consistente visualmente. Esta unidade não é apenas temática: refere-se,
especialmente, ao desenvolvimento de uma poética, um olhar singular sobre a
temática a que se pretende desenvolver.
Mais do que tudo, a experiência em uma leitura de portfólio é
um exercício de se apresentar para o mercado de produção em fotografia, e, especialmente, estar disposto (e aberto) a
ouvir. Isso não significa que seu trabalho será uma unanimidade entre os
revisores, mas que estes profissionais farão
apontamentos valiosos para o amadurecimento da proposta que se deseja
apresentar, seja optando por uma mostra ou pela edição de um fotolivro, ou
mesmo ambos.
O olhar do revisor traz o conhecimento apurado sobre o
processo de edição, algo tão difícil para todo fotógrafo que deseja apresentar
uma proposta autoral, mas o momento fundamental para a formação de um “corpo”, ou,
simplesmente, de uma obra. É
importante perceber que, na apresentação de um trabalho, as escolhas não podem
ser feitas ao acaso: acima de tudo é necessário decisão, obtendo controle sobre
todo o processo que resultará em uma obra.
Ou seja, apresentar um trabalho em fotografia não é apenas
ter boas noções de composição e fazer boas fotos. É ter também o domínio deste
processo de edição do trabalho, propondo uma unidade não apenas temática, mas
estética, e propondo uma sequência de imagens que forme uma narrativa capaz de
contar visualmente uma história. Isto me lembra Cartier-Bresson, quando fala
que ao fotografar criamos em imagem algo que não conseguimos transmitir em
palavras. A formação de uma sequência visual, em especial para propostas de
fotografia documental (não confundir com fotojornalismo!), é, pois, o elemento
fundante, o que confere força narrativa ao trabalho.
Entretanto, em vários momentos as dúvidas tendem a aumentar,
justamente porque o olhar dos revisores também denota uma postura singular. Muitas
vezes o entendimento que um revisor tem sobre um trabalho pode se opor a de
seus colegas, o que permite ao fotógrafo obter diferentes olhares (e por
consequência diferentes possibilidades de encaminhamento) para o seu trabalho. Este
momento de dúvidas é especial porque nos faz olhar para a nossa produção de
outras formas, justamente porque estamos tão imersos no processo, e não
conseguimos ter este distanciamento, também sempre necessário.
Outra experiência fantástica de se vivenciar um festival é a
possibilidade de estar em relação com a obra de fotógrafos do mundo inteiro.
Entre os muitos em exposição em diversas galerias e centros culturais da
cidade, destaco, em especial, a obra Nos
jardins do Éden, do brasileiro Christian Cravo. Neste ensaio, o fotógrafo
apresenta imagens sobre os rituais mágico-religiosos do Voodoo no Haiti. Uma intensa
aula de tratamento de composição e luz, ambiência dramática e, a mais do que
nunca tão necessária... sensibilidade!
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Obra do ensaio Nos Jardins do Éden, de Christian Cravo |
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Obra do ensaio Nos Jardins do Éden, de Christian Cravo
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Para mais informações sobre o festival, há uma ótima edição
do jornal cultural BUE, que também está disponível online.